segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Os vizinhos de Cora Coralina...

Hoje pela manhã vi na TV que em alguns estados do Brasil, como Goiás, São Paulo e também no Distrito Federal comemora-se no dia 20 de agosto o DIA DO VIZINHO. O Brasil inteiro deveria lembrar também que esta é a data do natalício de CORA CORALINA e agraciar a programação com a doce poesia desta poeta-doceira goiana. A nós, Roedores de Livros, cabe lembrar que esta comemoração foi uma sugestão de Cora aos governantes do seu tempo. Ela costumava dizer que o vizinho “é mais que parente, pois é o primeiro a saber das coisas que acontecem na vida da gente”. Como forma de homenageá-la, decidiram que o DIA DO VIZINHO seria comemorado no dia do seu ANIVERSÁRIO. É certo que Cora morava no interior e que aqueles eram outros tempos. Para lembrar, aproveito para postar fotos da nossa última visita ao Museu Casa de Cora na Cidade de Goiás – um local imperdível onde a poesia ultrapassa os limites do papel e alcança o olhar pleno de horizontes. O poema abaixo está numa moldura pendurada na parede do quintal da casa de Cora e conquistou nossos corações (Eu, Lucia Elena, Anna Claudia Ramos e Tino Freitas) naquela visita. Uma dica: se o guia parecer apressado, não lhe dê ouvidos. Tenha paciência para absorver toda a sabedoria que impera no lugar. Uma sabedoria simples de quem sabe cultivar os amigos, de quem ainda dá bom dia ao vizinho.
Minha Poesia... Já era viva e eu, sequer nascida.
Veio escorrendo num veio longínquo de cascalho.
De pedra foi o meu berço.
De pedra tem sido meus caminhos.
Meus versos: pedras quebradas no rolar e
Bater de tantas pedras
Em torno, o abandono.
Aninha, a menina boba da casa.

Foi uma ex-escrava que me amamentou no
Seio fecundo.
Eram seus braços prazenteiros e generosos que
Me erguiam, ainda rastejante, e Aninha
Adormecia, ouvindo estórias de encantamento.

Minha madrinha Fada...
Eu era Aninha Borralheira.
Era ela que me tirava das cinzas e me calçava
Sapatinhos de cristal.
Me vestia. Me carregava na Procissão.
Eu dormia na cadeirinha de seus braços.
E sonhava que era um anjo de verdade
Aconchegada na nuvem macia de seu xale.

Toda melhor lembrança da minha pueria
Distante está ligada a essa antiga escrava.

No tarde da minha vida assento o seu nome
Na pedra rude do meu verso: Mãe Didi.

Cora Coralina.

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