A rosa desabrochou no jardim da Creche Comunitária da Criança naquela manhã de sábado, 04 de outubro. Inspiração bonita e perfumada para o primeiro dia em que o projeto aconteceria na sala da biblioteca. Fazia frio lá fora e, embora as almofadas ainda não estivessem prontas, a melhor opção foi usufruir do espaço que nos foi oferecido no início do ano e que, até então, servira "apenas" como sala para nossas estantes recheadas, porém sempre famintas, de livros.
A sala não ficou tão cheia de crianças. Apareceram uma dúzia de roedores de livros mirins. Mas, de fato, estava cheia de histórias. No início, todos estranhamos a "casa nova". Era muito menor se comparássemos ao jardim onde acontecíamos até então. Tino espalhou um pouco de música antes de começarmos a mediação e a sala pareceu maior. A seleção de livros deu liga e pescou a meninada. Comecei escolhendo um livro do acervo do projeto. Ali mesmo, na estante, ao alcance dos olhos e das mãos. Nada melhor do que Sylvia Orthof e a sua Maria Vai com as Outras para inaugurar as leituras. Logo, logo, os "também" do texto ganhavam as vozes e as "marias" roedoras seguiam o enredo comigo até que uma feijoada despertou algumas gargalhadas. E a hora do almoço ainda estava longe.
Uma das músicas que o Tino fez para o Firimfimfoca (espetáculo que mistura contação de histórias e teatro) chama-se "Eu não, eu nada" e começa com uma frase chocante para os ouvidos adultos: "Se você come cocô". Mas as crianças adoram!!! É a canção que introduz a história Maria vai com as outras no espetáculo. Pensando nisso, o livro escolhido para a mediação seguinte foi Da Pequena Toupeira que Queria Saber quem Teria Feito Cocô na Cabeça Dela. A história é muito boa e as ilustrações atiçam a curiosidade do leitor. Foi divertidíssimo!!!
Terminei minha mediação com o livro-mistério Quem Matou Honorato, o rato. A cada página as crianças iam juntando as pistas e, ao final, o Ariel adivinhou o desfecho. Foi uma surpresa para todos.
Então, o Tino pescou do nosso acervo Um Papai Sob Medida e a turma se identificou com a história da filha que relata a busca da sua mamãe, uma heroína imbatível, por um novo marido, repleto de qualidades. A vida não é tão perfeita assim. E o livro, demonstra isso de uma maneira muito sutil.
Por fim, a imagem acima foi escolhida por alguns motivos. Se você já acompanha nosso blog há algum tempo, verá que paredes e teto cercam o que acontecia antes sob o céu azul e um amplo jardim. Para nós ficou a certeza de que nosso cantinho está garantido com sol, chuva, frio ou calor. Os Roedores de Livros acontecerão ali - no jardim ou na sala - independente da meteorologia. Para 12 crianças. Para 30!!! De qualquer forma, ali, na Creche Comunitária da Criança, quem quiser se chegar para uma aventura semanal no universo dos livros, dará com os olhos na frase estampada na foto e escancarada em nossos braços abertos: SEJAM BEM VINDOS!!! Hatuna Matata.
sexta-feira, 31 de outubro de 2008
O Saci Roedor de OHI.
Em 31 de outubro de 2006, ganhamos de presente do Ohi o Saci Roedor reproduzido acima. Aproveito a data para relembrar este momento e convidá-los a conhecer mais sobre sacis e sobre o trabalho deste ilustrador no link daquela data. Viva o DIA DO SACI!!! Hatuna Matata!!!
quinta-feira, 30 de outubro de 2008
Roedores de Livros selecionado para o prêmio Mãos da Cidadania
Queridos amigos, nesta quinta, 30 de outubro, o jornal Correio Braziliense publica em seu caderno Cidades a relação de 14 projetos selecionados para a final do prêmio MÃOS DA CIDADANIA, uma iniciativa daquele jornal que busca divulgar ações voluntárias no Distrito Federal, divididas em cinco categorias: Educação, Cultura, Tecnologia, Saúde e Esporte. Nosso projeto ROEDORES DE LIVROS aparece como um dos selecionados na categoria CULTURA. A divulgação do nosso trabalho em meio a outras ações igualmente importantes já vale como premiação, pois dá mais visibilidade ao projeto junto ao público local. E essa visibilidade pode significar mais conquistas futuras e até - quem sabe - servir de inspiração para que outras pessoas se sintam motivadas a agir em prol da sociedade. Parabéns ao Correio Braziliense pela iniciativa. Lembramos ainda que será aberta uma votação para que os internautas escolham os melhores projetos em cada categoria, a partir de amanhã, no site MÃOS DA CIDADANIA. Em breve, postaremos mais informações. Hatuna Matata.
P.S. Para ler a reportagem, basta clicar sobre a imagem acima.
P.S. Para ler a reportagem, basta clicar sobre a imagem acima.
segunda-feira, 27 de outubro de 2008
Aprendendo com as crianças e a chuva.
Diário dos roedores – dia 27.09.2008 – por Edna Freitass
Desde que entrei para os Roedores de Livros percebo que as crianças têm muito a nos ensinar. O dia 27 de setembro foi mais um dia de aprendizagem. Amanheceu chovendo muito forte no distrito federal. Depois de mais de 100 dias de seca, a água não pingava: jorrava do escuro céu molhando o Guará, a Ceilândia e Sobradinho. Cidades distantes entre si, mas que abrigam a base dos Roedores de Livros. Era muita chuva. Ana Paula ligou e conversamos acerca do temporal que caia e especulamos se o projeto aconteceria ou não naquela manhã tempestuosa. Irmos até Ceilândia naquele aguaceiro era um risco até de um possível acidente de carro. Mas adúvida maior era outra: será que as crianças sairiam de casa para ir ao projeto?
Após muita conversa, chegamos a conclusão de que seria quase certo de que elas não iriam até lá. Assim, cancelei a encomenda que havíamos feito para o lanche. Mas, combinei com a Ana Paula que ela e o Tino não precisavam ir. Eu e Ilse iríamos até Ceilândia, aproveitando a possível ausência das crianças para organizar o acervo da nossa biblioteca. Com a falta de pessoal, algumas burocracias necessárias ficaram de lado e aquela seria uma oportunidade de fazer um levantamento dos empréstimos, ver quais livros não haviam sido devolvidos, conferir os títulos, etc. Quarenta minutos depois, ao chegarmos ao centro comunitário, o pátio estava vazio de gente e cheio de água. Naquele momento, a chuva só pingava como uma torneira mal-fechada. Normalmente quando chego, sempre encontro algumas crianças brincando no parquinho. E ele também estava vazio. Pensei, é claro, que todas as crianças decidiram ficar em casa. Naquele clima era, de fato, tentador ficar na cama, sob o cobertor. Ilse e eu descemos do carro, pegamos todo o material para fazermos a catalogação dos livros. Nos dirigimos para a porta principal da creche. O segurança se antecipou e abriu a porta para nós.
De repente... Surpresa!!! Não acreditei no que via. Ali na sala de recepção havia 12 crianças, sentadas num sofá. Empilhadas feito pingüins espantando o frio. E como fazia frio. O assento era pequeno para tantas crianças, seus casacos e guarda-chuvas. Nos olharam com um ar de felicidade. Imediatamente pensei na ação que deveria tomar. O lanche já estava cancelado. Ana Paula não havia aparecido para fazer a mediação. O que fazer? O jeito foi improvisar: pedi desculpas e expliquei que, por alguns motivos importantes, o projeto não aconteceria naquela manhã como de costume. Apenas faríamos a devolução dos livros e o empréstimo dos novos. Em poucos minutos, já sem a chuva, as crianças voltaram para suas casas.
Ilse e eu ficamos com o nosso coração apertado. Eu me senti tão abalada que sequer fotografei as crianças, a chuva... a situação. Pouco depois, assim que iniciamos as atividades de catalogação, outra surpresa: Ana Paula chegou. O Tino havia ficado em casa, mas ela, assim que a chuva diminuiu de intensidade, resolveu enfrentar a distância e o asfalto escorregadio. Ficamos nós três e os livros. Sem as crianças. Organizamos a quase-bagunça, planejamos algumas ações para breve mas, principalmente, saímos de lá com mais uma lição na bagagem. Lição que, mais uma vez, aprendemos com as crianças do projeto: enquanto hesitávamos entre ir ou não ao projeto, principalmente na dúvida sobre a presença das crianças naquela manhã chuvosa, 12 crianças foram para lá com a CERTEZA de que estaríamos esperando por elas. Elas enfrentaram a preguiça de uma manhã fria e tempestuosa para nos encontrar e ouvir histórias. Isto sim é que é uma ótima história para contar!
P.S. Ah... e não adianta São Pedro insistir. Depois da lição aprendida, pode vir chuva, granizo ou neve, que estaremos a postos!!!
Desde que entrei para os Roedores de Livros percebo que as crianças têm muito a nos ensinar. O dia 27 de setembro foi mais um dia de aprendizagem. Amanheceu chovendo muito forte no distrito federal. Depois de mais de 100 dias de seca, a água não pingava: jorrava do escuro céu molhando o Guará, a Ceilândia e Sobradinho. Cidades distantes entre si, mas que abrigam a base dos Roedores de Livros. Era muita chuva. Ana Paula ligou e conversamos acerca do temporal que caia e especulamos se o projeto aconteceria ou não naquela manhã tempestuosa. Irmos até Ceilândia naquele aguaceiro era um risco até de um possível acidente de carro. Mas adúvida maior era outra: será que as crianças sairiam de casa para ir ao projeto?
Após muita conversa, chegamos a conclusão de que seria quase certo de que elas não iriam até lá. Assim, cancelei a encomenda que havíamos feito para o lanche. Mas, combinei com a Ana Paula que ela e o Tino não precisavam ir. Eu e Ilse iríamos até Ceilândia, aproveitando a possível ausência das crianças para organizar o acervo da nossa biblioteca. Com a falta de pessoal, algumas burocracias necessárias ficaram de lado e aquela seria uma oportunidade de fazer um levantamento dos empréstimos, ver quais livros não haviam sido devolvidos, conferir os títulos, etc. Quarenta minutos depois, ao chegarmos ao centro comunitário, o pátio estava vazio de gente e cheio de água. Naquele momento, a chuva só pingava como uma torneira mal-fechada. Normalmente quando chego, sempre encontro algumas crianças brincando no parquinho. E ele também estava vazio. Pensei, é claro, que todas as crianças decidiram ficar em casa. Naquele clima era, de fato, tentador ficar na cama, sob o cobertor. Ilse e eu descemos do carro, pegamos todo o material para fazermos a catalogação dos livros. Nos dirigimos para a porta principal da creche. O segurança se antecipou e abriu a porta para nós.
De repente... Surpresa!!! Não acreditei no que via. Ali na sala de recepção havia 12 crianças, sentadas num sofá. Empilhadas feito pingüins espantando o frio. E como fazia frio. O assento era pequeno para tantas crianças, seus casacos e guarda-chuvas. Nos olharam com um ar de felicidade. Imediatamente pensei na ação que deveria tomar. O lanche já estava cancelado. Ana Paula não havia aparecido para fazer a mediação. O que fazer? O jeito foi improvisar: pedi desculpas e expliquei que, por alguns motivos importantes, o projeto não aconteceria naquela manhã como de costume. Apenas faríamos a devolução dos livros e o empréstimo dos novos. Em poucos minutos, já sem a chuva, as crianças voltaram para suas casas.
Ilse e eu ficamos com o nosso coração apertado. Eu me senti tão abalada que sequer fotografei as crianças, a chuva... a situação. Pouco depois, assim que iniciamos as atividades de catalogação, outra surpresa: Ana Paula chegou. O Tino havia ficado em casa, mas ela, assim que a chuva diminuiu de intensidade, resolveu enfrentar a distância e o asfalto escorregadio. Ficamos nós três e os livros. Sem as crianças. Organizamos a quase-bagunça, planejamos algumas ações para breve mas, principalmente, saímos de lá com mais uma lição na bagagem. Lição que, mais uma vez, aprendemos com as crianças do projeto: enquanto hesitávamos entre ir ou não ao projeto, principalmente na dúvida sobre a presença das crianças naquela manhã chuvosa, 12 crianças foram para lá com a CERTEZA de que estaríamos esperando por elas. Elas enfrentaram a preguiça de uma manhã fria e tempestuosa para nos encontrar e ouvir histórias. Isto sim é que é uma ótima história para contar!
P.S. Ah... e não adianta São Pedro insistir. Depois da lição aprendida, pode vir chuva, granizo ou neve, que estaremos a postos!!!
quarta-feira, 22 de outubro de 2008
A vida alegre de uma encontradora de coisas.
Não tive a oportunidade de ler PÍPPI MEIALONGA aos 10, 12 ou 15 anos. Acho que a personagem seria uma companheira e tanto naqueles anos. Certamente não existia um exemplar na biblioteca da minha escola (li quase tudo de lá). Mas a personagem do clássico livro que a sueca Astrid Lindgren publicou em 1946 me encantou em 2002. Aquela leitura transportou meus pensamentos para os anos em que minha infância fazia fronteira com a adolescência quando, de certa forma, eu estava sozinha no mundo. Sozinha com minhas idéias, com meus sonhos. Lembrei que vez em quando queria ficar só por um bom tempo, livre para brincar o tempo que quizesse, tomar banho de três em três dias, comer fora de hora e ter quantos bichos de estimação coubessem na minha vontade. Coisas de criança.
A vida de Píppi é um pouco fora dos padrões: mora na Vila Vilekula na companhia de um cavalo e do Sr. Nilson, seu macaco de estimação. E os seus pais? Sua mãe havia morrido quando ela ainda era um bebê e seu pai, um capitão de navio que sumiu depois de uma tempestade, sobrevivera ao naufrágio e, desde então, se transformou no rei dos canibais de uma ilha distante. Antes de sumir, deixou uma arca cheia de moedas de ouro para a filha que passou a ser dona do seu nariz, embora toda a cidade estranhe aquela situação. Quando a coisa parece que vai desandar, ela diz: “não se preocupem comigo, eu sempre dou um jeito”. E ela dá mesmo.
Píppi tem um jeito especial de se vestir, é forte o suficiente para carregar seu cavalo nos braços e – acima de tudo - é uma exímia contadora de histórias. Afinal de contas, viajou o mundo inteiro no navio de seu pai. Quando seus vizinhos, os pequenos irmãos Tom e Aninha, tentam colocar um pouco de realidade na vida fantasiosa de Píppi, ela sempre sai com uma tirada incrível. Depois diz que não faz mal mentir um pouco. E afirma que “no Congo Belga não há uma única pessoa que diga a verdade. Todo mundo mente o tempo todo.” O texto - com tradução direto do sueco por Maria de Macedo - é genial, repleto de bom humor e frases cheias de genialidades infantis que nos fazem retornar aos tempos de meninice. O capítulo que relata sua ida à escola é o meu favorito. Mas o livro todo é delicioso. Passaporte direto para a infância feliz, sem preconceitos, sem dogmas, sem tritezas. Assim, a vida é boa. Mais ainda quando se é criança.
Há alguns dias, acompanhando as tarefas da escola de minha filha Júlia, vi que ela carregava a Píppi Meialonga à tiracolo. A mesma edição de capa laranja, com ilustrações de Michael Chesworth, que eu havia descoberto em 2002. Perguntei se a professora tinha mandado ela ler aquele livro e ela respondeu que não. “Eu que escolhi este”, disse a minha menina. Fiquei pensando no que se passava no fundo dos seus olhos enquanto lia a história de uma menina inteligente, poderosa e capaz de jogar um menino do chão para o topo de uma árvore. Advinhando meus pensamentos, Julia disse – apertando seus olhinhos cor de jabuticaba e segurando um riso sarcástico: “estou adorando”. Não pude deixar de compartilhar meu sorriso com o dela.
Passadas algumas semanas, Píppi esteve novamente em nossas vidas. Eu passeava numa livraria com o Tino quando me deparei com a novíssima edição brasileira que conta com a mesma tradução da anterior, porém num acabamento de luxo que conta com capa dura, sobre capa, um formato maior, papel especial e com ilustrações coloridíssimas de Lauren Child (aquela que também escreve e ilustra Charlie e Lolla e Clarice Bean). O projeto gráfico possibilita que, muitas vezes, texto e ilustração façam parte de uma mesma linha do enredo. Não é só ilustrar o que está escrito e sim fazer parte da história. Confesso que num primeiro momento achei tudo a cara dos personagens tradicionais da ilustradora, mas aos poucos fui pescando as sutilezas. A nova edição é um primor. Veio correndo aqui para casa e o Tino foi, enfim, conhecer a famosa aventura da menina superindependente.
No meio disso tudo, Júlia apareceu com um trabalho da escola que pedia para que o aluno criasse algo sobre algum livro que tivesse lido este ano. Não foi surpresa a escolha dela: Píppi Meialonga. Aí eu improvisei uma peruca cor de cenoura, um vestido colorido, os sapatões do Tino agasalhando meias do Fluminense (sim, ela é uma fiel tricolor). Minha menina tinha o seu Sr. Nilson de pelúcia agarrado ao seu pescoço. A noite anterior à apresentação foi uma festa aqui em casa. Píppi reinou mais uma vez, 60 anos depois, incorporada por todos nós, encantados com sua história fantástica.
É incrível pensar que a Imprensa Oficial da Suécia, ao receber os originais do livro em 1944, recusou sua publicação e ainda recomendou por escrito: “Esperamos que isto não seja mostrado ao Comitê de Bem-Estar da Criança”. Um ano depois, Astrid enviou seu texto para um concurso de uma editora. Ganhou o primeiro lugar e a publicação no ano seguinte. Píppi hoje mora no coração de crianças e adultos em mais de 70 países. Experimente brincar com seus filhos de fazer biscoitos de canela à moda Píppi ou de personificar os “encontradores de coisas” pela estrada a fora. E se você achar que isso pode ser um problema, inspire-se na pequena Píppi. Ela sempre dá um jeito. Hatuna Matata!!!
P.S. Enquanto escrevia este texto, o CD do VINCE GUARALDI TRIO, A BOY NAMED CHARLIE BROWN descia gostoso por meus ouvidos, recheando-os com os maravilhosos temas instrumentais que ouvíamos nos geniais desenhos do SNOOPY e sua turma.
A vida de Píppi é um pouco fora dos padrões: mora na Vila Vilekula na companhia de um cavalo e do Sr. Nilson, seu macaco de estimação. E os seus pais? Sua mãe havia morrido quando ela ainda era um bebê e seu pai, um capitão de navio que sumiu depois de uma tempestade, sobrevivera ao naufrágio e, desde então, se transformou no rei dos canibais de uma ilha distante. Antes de sumir, deixou uma arca cheia de moedas de ouro para a filha que passou a ser dona do seu nariz, embora toda a cidade estranhe aquela situação. Quando a coisa parece que vai desandar, ela diz: “não se preocupem comigo, eu sempre dou um jeito”. E ela dá mesmo.
Píppi tem um jeito especial de se vestir, é forte o suficiente para carregar seu cavalo nos braços e – acima de tudo - é uma exímia contadora de histórias. Afinal de contas, viajou o mundo inteiro no navio de seu pai. Quando seus vizinhos, os pequenos irmãos Tom e Aninha, tentam colocar um pouco de realidade na vida fantasiosa de Píppi, ela sempre sai com uma tirada incrível. Depois diz que não faz mal mentir um pouco. E afirma que “no Congo Belga não há uma única pessoa que diga a verdade. Todo mundo mente o tempo todo.” O texto - com tradução direto do sueco por Maria de Macedo - é genial, repleto de bom humor e frases cheias de genialidades infantis que nos fazem retornar aos tempos de meninice. O capítulo que relata sua ida à escola é o meu favorito. Mas o livro todo é delicioso. Passaporte direto para a infância feliz, sem preconceitos, sem dogmas, sem tritezas. Assim, a vida é boa. Mais ainda quando se é criança.
Há alguns dias, acompanhando as tarefas da escola de minha filha Júlia, vi que ela carregava a Píppi Meialonga à tiracolo. A mesma edição de capa laranja, com ilustrações de Michael Chesworth, que eu havia descoberto em 2002. Perguntei se a professora tinha mandado ela ler aquele livro e ela respondeu que não. “Eu que escolhi este”, disse a minha menina. Fiquei pensando no que se passava no fundo dos seus olhos enquanto lia a história de uma menina inteligente, poderosa e capaz de jogar um menino do chão para o topo de uma árvore. Advinhando meus pensamentos, Julia disse – apertando seus olhinhos cor de jabuticaba e segurando um riso sarcástico: “estou adorando”. Não pude deixar de compartilhar meu sorriso com o dela.
Passadas algumas semanas, Píppi esteve novamente em nossas vidas. Eu passeava numa livraria com o Tino quando me deparei com a novíssima edição brasileira que conta com a mesma tradução da anterior, porém num acabamento de luxo que conta com capa dura, sobre capa, um formato maior, papel especial e com ilustrações coloridíssimas de Lauren Child (aquela que também escreve e ilustra Charlie e Lolla e Clarice Bean). O projeto gráfico possibilita que, muitas vezes, texto e ilustração façam parte de uma mesma linha do enredo. Não é só ilustrar o que está escrito e sim fazer parte da história. Confesso que num primeiro momento achei tudo a cara dos personagens tradicionais da ilustradora, mas aos poucos fui pescando as sutilezas. A nova edição é um primor. Veio correndo aqui para casa e o Tino foi, enfim, conhecer a famosa aventura da menina superindependente.
No meio disso tudo, Júlia apareceu com um trabalho da escola que pedia para que o aluno criasse algo sobre algum livro que tivesse lido este ano. Não foi surpresa a escolha dela: Píppi Meialonga. Aí eu improvisei uma peruca cor de cenoura, um vestido colorido, os sapatões do Tino agasalhando meias do Fluminense (sim, ela é uma fiel tricolor). Minha menina tinha o seu Sr. Nilson de pelúcia agarrado ao seu pescoço. A noite anterior à apresentação foi uma festa aqui em casa. Píppi reinou mais uma vez, 60 anos depois, incorporada por todos nós, encantados com sua história fantástica.
É incrível pensar que a Imprensa Oficial da Suécia, ao receber os originais do livro em 1944, recusou sua publicação e ainda recomendou por escrito: “Esperamos que isto não seja mostrado ao Comitê de Bem-Estar da Criança”. Um ano depois, Astrid enviou seu texto para um concurso de uma editora. Ganhou o primeiro lugar e a publicação no ano seguinte. Píppi hoje mora no coração de crianças e adultos em mais de 70 países. Experimente brincar com seus filhos de fazer biscoitos de canela à moda Píppi ou de personificar os “encontradores de coisas” pela estrada a fora. E se você achar que isso pode ser um problema, inspire-se na pequena Píppi. Ela sempre dá um jeito. Hatuna Matata!!!
P.S. Enquanto escrevia este texto, o CD do VINCE GUARALDI TRIO, A BOY NAMED CHARLIE BROWN descia gostoso por meus ouvidos, recheando-os com os maravilhosos temas instrumentais que ouvíamos nos geniais desenhos do SNOOPY e sua turma.
sábado, 18 de outubro de 2008
Dobrando o frio e multiplicando amigos...
No sábado, 20 de setembro, os Roedores de Livros acolheram mais uma parceira. Convidada por Edna, Ilse deu o ar da sua graça naquela manhã fria e agora soma-se a Ana Paula, Celio, Edna e a mim no staff semanal da nossa equipe. Trouxe, além da disposição para ajudar e a curiosidade em torno da literatura infantil, a serenidade desenhada em seus traços orientais. Serenidade sempre necessária por aqui.
Por falar em manhã fria, a sombra do pinheiro não conseguiu conter o arrepio. O jeito foi achar um canto de parede no pátio interno do Centro Comunitário da Criança. Nada nao. Foi ótimo e acolhedor. Para esquentar, abri os "trabalhos" com uma seção musical para esquentar o juízo e espantar a preguiça. Entre as canções, a Minhoca foi seguida do beijo de minhoca (não pergunte o que é... nào dá para explicar... só vendo). Beijo congelado na foto acima onde o Jaderson faz pose, com a Ana Letícia e a Beatriz ao fundo.
Naquela manhã escolhemos dois livros em que o texto vem carregado de humor e rimas. Comecei lendo O Menino que Chovia e depois contei a versão em cordel ilustrado para O Bicho Folharal. Foi uma leitura repleta de sorrisos. Ana Paula aproveitou a deixa da versão da história do nosso folclore e ministrou uma oficina de origami, onde nossos pequenos leitores criaram seus macacos e onças em dobraduras de papel. Em casa, com os dois personagens na mão, nossa turma poderia recontar a história ouvida naquela manhã.
Foi mais um dia em que o livro e a arte se uniram para deixar mais gostosa a fantasia das nossas crianças. A manhã foi fria, mas as histórias, as dobraduras e a chegada da Ilse como nova parceira deram um gás em tudo o mais e continuamos em frente.
Hatuna Matata.
Por falar em manhã fria, a sombra do pinheiro não conseguiu conter o arrepio. O jeito foi achar um canto de parede no pátio interno do Centro Comunitário da Criança. Nada nao. Foi ótimo e acolhedor. Para esquentar, abri os "trabalhos" com uma seção musical para esquentar o juízo e espantar a preguiça. Entre as canções, a Minhoca foi seguida do beijo de minhoca (não pergunte o que é... nào dá para explicar... só vendo). Beijo congelado na foto acima onde o Jaderson faz pose, com a Ana Letícia e a Beatriz ao fundo.
Naquela manhã escolhemos dois livros em que o texto vem carregado de humor e rimas. Comecei lendo O Menino que Chovia e depois contei a versão em cordel ilustrado para O Bicho Folharal. Foi uma leitura repleta de sorrisos. Ana Paula aproveitou a deixa da versão da história do nosso folclore e ministrou uma oficina de origami, onde nossos pequenos leitores criaram seus macacos e onças em dobraduras de papel. Em casa, com os dois personagens na mão, nossa turma poderia recontar a história ouvida naquela manhã.
Foi mais um dia em que o livro e a arte se uniram para deixar mais gostosa a fantasia das nossas crianças. A manhã foi fria, mas as histórias, as dobraduras e a chegada da Ilse como nova parceira deram um gás em tudo o mais e continuamos em frente.
Hatuna Matata.
quinta-feira, 16 de outubro de 2008
Dia das Crianças.
Na semana passada, fizemos uma campanha entre alguns amigos para que o Dia das Crianças da turma dos Roedores de Livros fosse inesquecível para nossas crianças. Lembro sempre que nosso projeto é voluntário, conta com poucos - porém sérios - integrantes e, por isso, algumas ações se tornam pesadas para o nosso orçamento. A campanha foi um sucesso e nossos meninos e meninas tiveram uma manhã repleta de ótimas surpresas. Falaremos sobre todas em breve, mas queríamos agradecer a todos que ajudaram e mostrar na foto acima que o projeto conta com novas sacolas para as crianças (UFA!!!). No último sábado, o Célio chegou quase no final (pois tinha outros compromissos) mas a tempo de sair na foto. A Edna estava viajando (reparem no avião) mas não podia ficar de fora deste registro. Eu, Tino e Ilse, mais Cecília, Pedro e Júlia também estivemos por lá e aqui, mais uma vez, agradecemos o apoio de todos. Deixamos aqui o nosso fraternal abraço de letrinhas. Lá nos Roedores de Livros, todo dia é DIA DAS CRIANÇAS. Hatuna Matata!!!
quarta-feira, 15 de outubro de 2008
A primeira vez da Julia contando histórias...
Foi na Feira do Livro de Brasília que reencontrei a Juliana depois de um tempo sem fazermos um show juntos (a Ju teve que abandonar um pouco os "palcos" por motivos particulares). Mas é meio parecido com andar de bicicleta: a gente nunca esquece o "modus operantis". Apesar de seguirmos um roteiro, cada encontro é recheado de ótimas surpresas e cacos que fazem da nossa apresentação uma diversão só. Pelo menos para nós. Brincadeirinha... a turma (crianças e adultos se divertem com a apresentação em que misturamos contação de histórias e músicas durante quase uma hora. Da mitológica Pandora, até a perfumada A Menina que queria ser gambá , passando pela ponte d'Os Três Carneirinhos entre outras aventuras literárias, Ju segue desfilando suas habilidades Sherazadísticas. Neste encontro na Feira do Livro, na primeira semana de setembro, o que foi mais legal foi que ela levou a Julia na barriga. Foi a primeira vez da futura roedora de livros. Ali, éramos três em um. Três: eu, Juliana e Júlia. Um: Roedores de Livros. Hatuna Matata.
P.S. Vejam o tamanho do barrigão de sete meses.
P.S. Vejam o tamanho do barrigão de sete meses.
quarta-feira, 8 de outubro de 2008
Triste, mas bonita. Muito bonita!!!
Foi assim, naquela manhã de sábado, 13 de setembro de 2008. Queríamos contar uma história diferente, mas antes, brincamos com as possibilidades várias de leitura. Primeiro, numa homenagem a tantas semanas em que lemos Grimm, Andersen e Perroult, convidamos para nosso tapete vermelho o livro SÓ MAIS UMA HISTÓRIA (Texto de Douglad Steer, Ilustrações de Elisabeth Moseng, tradução de Gilda de Aquino, Brinque Book) que traz várias histórias dentro da história, e ainda outras mais pois, o enredo mostra uma mamãe porca tentando adormecer seu casal de filhos contando clássicos do mundo do Faz de Conta em "adaptações suínas". A cada história, os pequenos querem só mais uma história e a mãe segue atendendo o desejo dos seus rebentos. Entre as páginas, 04 pequenos livros aparecem revelando os recontos e encantando os leitores.
Leitores diversos como o desta seqüência de fotos. Durante nossas mediações, vez em quando aparece uma mamãe com um pequeno "roedor de livros". Naquela manhã, mais uma vez, a mágica se fez.
Enquanto o Tino fazia a mediação com o livro SÓ MAIS UMA HISTÓRIA, a criança foi se chegando, abraçou o livro com os olhos...
...e devolveu um carinho gostoso.
Depois fizemos um jogo de repetição de trava-línguas com o livro EMBOLA ENROLA E ROLA (Texto de Maurício Veneza, Atual). Conseguimos muitos risos, ops, eitas e caracas. Muito bom.
Foi então que aquela idéia lá do início do texto entrou em ação. Era a hora da tal história diferente. Perguntei a todos se ali tinha alguém que gostava de história triste. Samuel foi o primeiro a dizer enfaticamente que DETESTAVA história triste. Outros seguiram a mesma opinião. Aí, anunciei que iria contar uma história triste. Caras e bocas de desaprovação. Fui em frente. Apresentei o livro: DOZE REIS E A MOÇA NO LABIRINTO DO VENTO (Textos e ilustrações de Marina Colasanti, Global). ADORO, ADORO, ADORO este livro. Queria muito contar suas histórias para a turma. Foi naquele dia que comecei. Apresentei a história escolhida no meio dos 13 contos de fadas que habitam aquele livro encantado: ENTRE LEÃO E UNICÓRNIO. E foi assim, a turma foi se chegando, embalada pelas palavras de Marina que embalavam a fantasia de todos com um leão que guardava os sonhos da rainha ao pé da cama e um rei encantado pela beleza de um unicórnio azul (quase que saído da canção de Silvio Rodriguez). De repente eu estava cercada pelas crianças. Não há como negar. O final da história não é feliz. Mas o menino Samuel, o primeiro a rejeitar a possibilidade de ouvir uma história triste, deixou claro logo após o ponto final: - Mas é uma história bonita!!! Gostei!!! Ah... para falar a verdade, acho que quem mais gostou (da história do livro e da história que conto aqui) fui eu. Hatuna Matata!!!
Leitores diversos como o desta seqüência de fotos. Durante nossas mediações, vez em quando aparece uma mamãe com um pequeno "roedor de livros". Naquela manhã, mais uma vez, a mágica se fez.
Enquanto o Tino fazia a mediação com o livro SÓ MAIS UMA HISTÓRIA, a criança foi se chegando, abraçou o livro com os olhos...
...e devolveu um carinho gostoso.
Depois fizemos um jogo de repetição de trava-línguas com o livro EMBOLA ENROLA E ROLA (Texto de Maurício Veneza, Atual). Conseguimos muitos risos, ops, eitas e caracas. Muito bom.
Foi então que aquela idéia lá do início do texto entrou em ação. Era a hora da tal história diferente. Perguntei a todos se ali tinha alguém que gostava de história triste. Samuel foi o primeiro a dizer enfaticamente que DETESTAVA história triste. Outros seguiram a mesma opinião. Aí, anunciei que iria contar uma história triste. Caras e bocas de desaprovação. Fui em frente. Apresentei o livro: DOZE REIS E A MOÇA NO LABIRINTO DO VENTO (Textos e ilustrações de Marina Colasanti, Global). ADORO, ADORO, ADORO este livro. Queria muito contar suas histórias para a turma. Foi naquele dia que comecei. Apresentei a história escolhida no meio dos 13 contos de fadas que habitam aquele livro encantado: ENTRE LEÃO E UNICÓRNIO. E foi assim, a turma foi se chegando, embalada pelas palavras de Marina que embalavam a fantasia de todos com um leão que guardava os sonhos da rainha ao pé da cama e um rei encantado pela beleza de um unicórnio azul (quase que saído da canção de Silvio Rodriguez). De repente eu estava cercada pelas crianças. Não há como negar. O final da história não é feliz. Mas o menino Samuel, o primeiro a rejeitar a possibilidade de ouvir uma história triste, deixou claro logo após o ponto final: - Mas é uma história bonita!!! Gostei!!! Ah... para falar a verdade, acho que quem mais gostou (da história do livro e da história que conto aqui) fui eu. Hatuna Matata!!!
sábado, 4 de outubro de 2008
Unidos na guerra, falando de paz!!!
Dia desses estava saindo de casa para acompanhar Ana Paula numa seção de fisioterapia quando lembrei de pegar um livro para ser minha companhia na sala de espera. Eu já estava lendo uma história muito boa, mas o tal livro descansava na minha maleta, distante daquele momento em que o carro e Ana esperavam na porta de casa. O mais fácil foi pescar o primeiro livro numa pilha de leituras que fica cada vez mais íngreme ao lado da nossa cama. Era o livro A ÚLTIMA GUERRA (Luiz Bras e Tereza Yamashita, Biruta). Seria uma ótima oportunidade para conhecer a coleção Leituras Descoladas cujo projeto gráfico havia conquistado o meu olhar. Este livro pertence a tal coleção junto com outros cinco títulos. Foi uma surpresa e tanto. O livro não é só bonito, como oferece um texto ágil e conquistador em que o personagem principal segue conversando com o leitor numa gostosa provocação que nos leva sempre à página seguinte. Li numa sentada, na sala de espera da clínica de fisioterapia.
A história nos fala do menino Miguel e sua família, sua casa, sua cidade, sua vida. Todos afetados por uma guerra e suas bombas, soldados e tiros de metralhadora. O leitor vive a angústia de uma criança que sequer sabe quantos anos tem. Algo em torno de 11, 12 ou 13 anos. A guerra o fez perder a noção do tempo. A vida escondida pelos escombros da cidade, a angústia em não saber qual é o exército aliado, a falta de comida, de amigos. O MEDO. A LOUCURA. Enfim, a GUERRA. Um dia, o pequeno sobrevivente encontra um velho misterioso que tem o poder para acabar com o conflito destruindo tudo e criando um mundo novo. Você apertaria o botão? Sim ou não? Miguel precisa decidir em poucos segundos.
Luiz Bras e Tereza Yamashita criaram uma história que trata com muita inteligência de um tema delicado, oferecendo um bocado de realidade dura e crua além de uma clara percepção de quanto é àrdua a vida de quem está sob o fogo cerrado. O texto ganha ainda mais força com o rico projeto gráfico do REX DESIGN que - repleto de fotomontagens com caixas de papelão, usando de forma criativa o preto e o vermelho em contrase com o branco do papel e, principalmente destacando as primeiras frases de cada página com uma tipologia colorida e maior do que a “normal” - não deixa o leitor fechar o livro antes do fim. Muito pelo contrário. É um convite à página seguinte. Casamento perfeito entre texto e imagem. Me passou uma sensação parecida a de quando li A Invenção de Hugo Cabret, outra história em que o projeto gráfico arrasa!!!
Eu só gosaria que o livro terminasse na página 96. Seria algo assim como o final do filme A Bruxa de Blair. Fim e pronto. Sem epílogo. Na verdade, o livro termina na página 112. São mais cinco minutos muito gostosos de ler. Mas eu já estava satisfeito ali, na pagina 96. Provocar o leitor a usar mais a imaginação, incomodá-lo um pouco ao não oferecer tudo de bandeja também seria uma ótima solução. Os autores escolheram outro caminho e o livro é muito bom e ponto final.
Não, ainda não é ponto final pois lembrei de outro livro excepcional que aborda a GUERRA com beleza, sutileza e criatividade é O INIMIGO (texto de Davide Cali, ilustrações de Serge Bloch, tradução de Paulo Neves, Cosac & Naify). Comprei este livro por indicação do André Neves, fã do italiano Davide Cali, autor dos maravilhosos Um Papai sob medida e Fico à Espera, também em parceria com Serge Bloch.
O livro vem com um maravilhoso prólogo apresentando os elementos principais da história: um deserto indefinido e dois buracos habitados por dois soldados inimigos que aparentemente nada têm em comum a não ser o desejo de vencer a guerra. O outro é sempre um monstro. Afinal, foi isso que cada um aprendeu no manual de instruções produzido pelos senhores da guerra. Lá está escrito que o inimigo é mau, mata mulheres e crianças sem razão, é cruel e impiedoso. Por isso deve ser aniquilado. Mas, de fato… qual dos dois soldados é o inimigo? O conflito, que teve seu início há muito tempo, parece ter esquecido os soldados no meio do nada, naqueles buracos, expostos a sol, chuva, noites estreladas e, é claro, ao tiro diário disparado por cada um dos opositores. A história, toda contada em frases curtas, revela muito da natureza humana, das nossas semelhanças. Ora rica em virtudes, ora pobre em tanta mesquinhez.
O projeto gráfico une ilustrações e fotografias em pretos, vermelhos e um verde exército sempre dialogando agradavelmente com o branco. Complementam o texto com traços leves, irônicos, às vezes, divertidos, na medida certa, mas sérios, na busca de revelar ao leitor quem é o inimigo. Um exagero de sensibilidade e talento.
Há ainda outro trunfo desta edição: o livro acaba no meio de uma ação. O fim fica por conta da imaginação do leitor. Não podia ser diferente. Genial até o final. Um livro para todas as idades. Cada um pode dar a sua solução para o combate. Haverá um vencedor? A guerra continua ou acaba? Quem, de fato, é o inimigo? O fato é que, desde aquele encontro com André Neves na livraria, eu, corajosamente, trouxe O Inimigo para casa. Mas a certeza que tenho é de que nos tornamos mais amigos a cada leitura. Eu, André, Davide, Serge e os soldados. Hatuna Matata. Agora, sim, ponto final.
A história nos fala do menino Miguel e sua família, sua casa, sua cidade, sua vida. Todos afetados por uma guerra e suas bombas, soldados e tiros de metralhadora. O leitor vive a angústia de uma criança que sequer sabe quantos anos tem. Algo em torno de 11, 12 ou 13 anos. A guerra o fez perder a noção do tempo. A vida escondida pelos escombros da cidade, a angústia em não saber qual é o exército aliado, a falta de comida, de amigos. O MEDO. A LOUCURA. Enfim, a GUERRA. Um dia, o pequeno sobrevivente encontra um velho misterioso que tem o poder para acabar com o conflito destruindo tudo e criando um mundo novo. Você apertaria o botão? Sim ou não? Miguel precisa decidir em poucos segundos.
Luiz Bras e Tereza Yamashita criaram uma história que trata com muita inteligência de um tema delicado, oferecendo um bocado de realidade dura e crua além de uma clara percepção de quanto é àrdua a vida de quem está sob o fogo cerrado. O texto ganha ainda mais força com o rico projeto gráfico do REX DESIGN que - repleto de fotomontagens com caixas de papelão, usando de forma criativa o preto e o vermelho em contrase com o branco do papel e, principalmente destacando as primeiras frases de cada página com uma tipologia colorida e maior do que a “normal” - não deixa o leitor fechar o livro antes do fim. Muito pelo contrário. É um convite à página seguinte. Casamento perfeito entre texto e imagem. Me passou uma sensação parecida a de quando li A Invenção de Hugo Cabret, outra história em que o projeto gráfico arrasa!!!
Eu só gosaria que o livro terminasse na página 96. Seria algo assim como o final do filme A Bruxa de Blair. Fim e pronto. Sem epílogo. Na verdade, o livro termina na página 112. São mais cinco minutos muito gostosos de ler. Mas eu já estava satisfeito ali, na pagina 96. Provocar o leitor a usar mais a imaginação, incomodá-lo um pouco ao não oferecer tudo de bandeja também seria uma ótima solução. Os autores escolheram outro caminho e o livro é muito bom e ponto final.
Não, ainda não é ponto final pois lembrei de outro livro excepcional que aborda a GUERRA com beleza, sutileza e criatividade é O INIMIGO (texto de Davide Cali, ilustrações de Serge Bloch, tradução de Paulo Neves, Cosac & Naify). Comprei este livro por indicação do André Neves, fã do italiano Davide Cali, autor dos maravilhosos Um Papai sob medida e Fico à Espera, também em parceria com Serge Bloch.
O livro vem com um maravilhoso prólogo apresentando os elementos principais da história: um deserto indefinido e dois buracos habitados por dois soldados inimigos que aparentemente nada têm em comum a não ser o desejo de vencer a guerra. O outro é sempre um monstro. Afinal, foi isso que cada um aprendeu no manual de instruções produzido pelos senhores da guerra. Lá está escrito que o inimigo é mau, mata mulheres e crianças sem razão, é cruel e impiedoso. Por isso deve ser aniquilado. Mas, de fato… qual dos dois soldados é o inimigo? O conflito, que teve seu início há muito tempo, parece ter esquecido os soldados no meio do nada, naqueles buracos, expostos a sol, chuva, noites estreladas e, é claro, ao tiro diário disparado por cada um dos opositores. A história, toda contada em frases curtas, revela muito da natureza humana, das nossas semelhanças. Ora rica em virtudes, ora pobre em tanta mesquinhez.
O projeto gráfico une ilustrações e fotografias em pretos, vermelhos e um verde exército sempre dialogando agradavelmente com o branco. Complementam o texto com traços leves, irônicos, às vezes, divertidos, na medida certa, mas sérios, na busca de revelar ao leitor quem é o inimigo. Um exagero de sensibilidade e talento.
Há ainda outro trunfo desta edição: o livro acaba no meio de uma ação. O fim fica por conta da imaginação do leitor. Não podia ser diferente. Genial até o final. Um livro para todas as idades. Cada um pode dar a sua solução para o combate. Haverá um vencedor? A guerra continua ou acaba? Quem, de fato, é o inimigo? O fato é que, desde aquele encontro com André Neves na livraria, eu, corajosamente, trouxe O Inimigo para casa. Mas a certeza que tenho é de que nos tornamos mais amigos a cada leitura. Eu, André, Davide, Serge e os soldados. Hatuna Matata. Agora, sim, ponto final.
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