sábado, 4 de outubro de 2008

Unidos na guerra, falando de paz!!!

Dia desses estava saindo de casa para acompanhar Ana Paula numa seção de fisioterapia quando lembrei de pegar um livro para ser minha companhia na sala de espera. Eu já estava lendo uma história muito boa, mas o tal livro descansava na minha maleta, distante daquele momento em que o carro e Ana esperavam na porta de casa. O mais fácil foi pescar o primeiro livro numa pilha de leituras que fica cada vez mais íngreme ao lado da nossa cama. Era o livro A ÚLTIMA GUERRA (Luiz Bras e Tereza Yamashita, Biruta). Seria uma ótima oportunidade para conhecer a coleção Leituras Descoladas cujo projeto gráfico havia conquistado o meu olhar. Este livro pertence a tal coleção junto com outros cinco títulos. Foi uma surpresa e tanto. O livro não é só bonito, como oferece um texto ágil e conquistador em que o personagem principal segue conversando com o leitor numa gostosa provocação que nos leva sempre à página seguinte. Li numa sentada, na sala de espera da clínica de fisioterapia.
A história nos fala do menino Miguel e sua família, sua casa, sua cidade, sua vida. Todos afetados por uma guerra e suas bombas, soldados e tiros de metralhadora. O leitor vive a angústia de uma criança que sequer sabe quantos anos tem. Algo em torno de 11, 12 ou 13 anos. A guerra o fez perder a noção do tempo. A vida escondida pelos escombros da cidade, a angústia em não saber qual é o exército aliado, a falta de comida, de amigos. O MEDO. A LOUCURA. Enfim, a GUERRA. Um dia, o pequeno sobrevivente encontra um velho misterioso que tem o poder para acabar com o conflito destruindo tudo e criando um mundo novo. Você apertaria o botão? Sim ou não? Miguel precisa decidir em poucos segundos.
Luiz Bras e Tereza Yamashita criaram uma história que trata com muita inteligência de um tema delicado, oferecendo um bocado de realidade dura e crua além de uma clara percepção de quanto é àrdua a vida de quem está sob o fogo cerrado. O texto ganha ainda mais força com o rico projeto gráfico do REX DESIGN que - repleto de fotomontagens com caixas de papelão, usando de forma criativa o preto e o vermelho em contrase com o branco do papel e, principalmente destacando as primeiras frases de cada página com uma tipologia colorida e maior do que a “normal” - não deixa o leitor fechar o livro antes do fim. Muito pelo contrário. É um convite à página seguinte. Casamento perfeito entre texto e imagem. Me passou uma sensação parecida a de quando li A Invenção de Hugo Cabret, outra história em que o projeto gráfico arrasa!!!

Eu só gosaria que o livro terminasse na página 96. Seria algo assim como o final do filme A Bruxa de Blair. Fim e pronto. Sem epílogo. Na verdade, o livro termina na página 112. São mais cinco minutos muito gostosos de ler. Mas eu já estava satisfeito ali, na pagina 96. Provocar o leitor a usar mais a imaginação, incomodá-lo um pouco ao não oferecer tudo de bandeja também seria uma ótima solução. Os autores escolheram outro caminho e o livro é muito bom e ponto final.
Não, ainda não é ponto final pois lembrei de outro livro excepcional que aborda a GUERRA com beleza, sutileza e criatividade é O INIMIGO (texto de Davide Cali, ilustrações de Serge Bloch, tradução de Paulo Neves, Cosac & Naify). Comprei este livro por indicação do André Neves, fã do italiano Davide Cali, autor dos maravilhosos Um Papai sob medida e Fico à Espera, também em parceria com Serge Bloch.

O livro vem com um maravilhoso prólogo apresentando os elementos principais da história: um deserto indefinido e dois buracos habitados por dois soldados inimigos que aparentemente nada têm em comum a não ser o desejo de vencer a guerra. O outro é sempre um monstro. Afinal, foi isso que cada um aprendeu no manual de instruções produzido pelos senhores da guerra. Lá está escrito que o inimigo é mau, mata mulheres e crianças sem razão, é cruel e impiedoso. Por isso deve ser aniquilado. Mas, de fato… qual dos dois soldados é o inimigo? O conflito, que teve seu início há muito tempo, parece ter esquecido os soldados no meio do nada, naqueles buracos, expostos a sol, chuva, noites estreladas e, é claro, ao tiro diário disparado por cada um dos opositores. A história, toda contada em frases curtas, revela muito da natureza humana, das nossas semelhanças. Ora rica em virtudes, ora pobre em tanta mesquinhez.
O projeto gráfico une ilustrações e fotografias em pretos, vermelhos e um verde exército sempre dialogando agradavelmente com o branco. Complementam o texto com traços leves, irônicos, às vezes, divertidos, na medida certa, mas sérios, na busca de revelar ao leitor quem é o inimigo. Um exagero de sensibilidade e talento.
Há ainda outro trunfo desta edição: o livro acaba no meio de uma ação. O fim fica por conta da imaginação do leitor. Não podia ser diferente. Genial até o final. Um livro para todas as idades. Cada um pode dar a sua solução para o combate. Haverá um vencedor? A guerra continua ou acaba? Quem, de fato, é o inimigo? O fato é que, desde aquele encontro com André Neves na livraria, eu, corajosamente, trouxe O Inimigo para casa. Mas a certeza que tenho é de que nos tornamos mais amigos a cada leitura. Eu, André, Davide, Serge e os soldados. Hatuna Matata. Agora, sim, ponto final.

2 comentários:

Lígia Pin disse...

Fico me perguntando como você consegue ler tanto.
Beijos!

Anônimo disse...

Linda matéria Tino, como sempre todos vocês roedores estão de parabéns.
Um forte abraço amigo,
Marcelo