segunda-feira, 25 de junho de 2007

E a história fez sentido...

O inglês Charles Lutwige Dodgson gostava de brincar com as palavras. Era um craque na arte de escrever. Ficou conhecido mundialmente ao publicar o livro Alice no País das Maravilhas, em 1865 em que adotou o pseudônimo de L. C. Carrow (curiosamente, as iniciais, pronunciadas em inglês, lembram o som de Alice. Mais uma brincadeira?). Nunca fui muito fã desta história. Lembro do filme da Disney, adaptação em quadrinhos e de uma edição antiga que li mas não gostei. Achei a história muito louca. A loucura e o nonsense sempre estiveram próximos no nosso imaginário. Nonsense nos remete a algo sem sentido, louco, não é mesmo? Pois é... não é! Nonsense pode ser traduzido como “um sentido inverso, uma lógica ao contrário, vizinha do absurdo” como citaria Ana Maria Machado na introdução da sua magnífica tradução de ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS (Lewis Carroll, com ilustrações de Jô Oliveira, Ática). Quando pensei que havia desistido de Alice, recebo a indicação deste livro. Fui à livraria e, muito desconfiada, comprei o danado, pois, afinal de contas, tinha as ilustrações do meu querido Jô Oliveira. E isso já me servia como motivação.
Agora, passado muito tempo daquela infância moleque, posso dizer que valeu à pena esperar por esta edição. Ana Maria Machado fez a diferença – e como!!! Ao adaptar as sacadas – que sempre ouvi dizer serem geniais – do autor inglês para o nosso bom e velho português, ela conseguiu passar a idéia do tão celebrado nonsense. Alice ficou muito mais legal. Hoje também acho que as aventuras no País das Maravlhas não seja assim um livro tão infantil. Talvez seja preciso um pouco de intimidade com as palavras para absorver os trocadilhos. Para entender a brincadeira. O Amor cego do Morcego... Os dez mil linguados que consertam roupas e botas desmilingüidos... O medo dos peixes se aventurarem sozinhos no mar sem uma enguia para guiar... “Você tenguia?”... as adaptações das canções tradicionais inglesas para as nossas tradicionais “Peixe Vivo”, “A Casa” e “Acalanto”, por exemplo. Tudo isso faz valer a TRADUÇÃO / CRIAÇÃO, assim mesmo, em caixa alta, de Ana Maria Machado. Depois de devorar esta edição, Alice fez sentido para mim. Os capítulos “A História da Falsa Tartaruga” e “A Quadrilha das Lagostas” são excepcionais. Dá vontade de reler sempre!
Para completar a parceria excepcional, Jô Oliveira pôde se entregar a um projeto do qual é fã. Em visita recente à sua casa, vimos o quanto a obra de Lewis é importante para este ilustrador pernambucano. Sua biblioteca guarda cerca de uma centena de edições diferentes de Alice no País das Maravilhas. De adaptações em quadrinhos passando pelo original da Coleção Disquinho até uma edição fac-símile do manuscrito original. Ele é apaixonado por Alice. Sua paixão está eternizada em 25 ilustrações preto e branco no miolo desta edição. Todas com seu traço inconfundível repleto de brasilidade. A mesma brasilidade que Ana Maria Machado impôs ao texto. Uma delícia.
Uma leitura que, para mim, passa a fazer sentido e me remete a tantas aventuras familiares nas férias de verão daqueles desmilingüidos tempos da infância (na foto abaixo, eu, encantada não com coelhos, mas com galinhas d'angola).

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