sábado, 26 de janeiro de 2008

Boa Esperança, número 13.

Vivi a meninice numa rua chamada Boa Esperança. Era asfaltada, com oito casas de cada lado, todas com grades baixas. Minha casa era a de número 13. Boa Esperança, número 13. A sorte me acompanha desde aquele tempo. Mas o grande privilégio naquele começo dos anos 80 era que a nossa rua tinha uma turma. Oito garotos davam vida àquele espaço geográfico: Riva, Delane, Sílvio e eu nos juntávamos aos mais novos Márcio, Delile e Roosevelt... ah, o pequeno Dalmo se metia vez em quando nas brincadeiras. A grade das casas, que fazia as vezes de muro da frente, formada por barras de ferro, faziam um barulho estrondoso quando brincávamos de gol a gol e alguém errava a meta. Mas o esporte preferido da turma, que levava outros amigos para a rua em intermináveis campeonatos, era o Bete. Começava às oito da manhã e não tinha hora para acabar.
Bete é um jogo inspirado no basebol. São duas duplas. Uma no ataque, outra na defesa. Quem defende usa tacos. Dois círculos de giz com uns 60 centímetros de diâmetro a quinze, vinte passos de distância uma da outra, delimita a área onde a defesa deve estar com o taco em contato com o solo. A dupla de ataque joga uma pequena bola de borracha – ou de tênis – que deve derrubar um tripé (casinha) feito com gravetos que fica no interior dos círculos. Só a dupla que está na defesa faz pontos. Para isso deve rebater a bola e a partir daí cruzar o espaço trocando de lugar com o parceiro e batendo os tacos enquanto o ataque busca a bola e não oferece risco às bases. Caso derrube a casinha num arremesso ou acerte alguém da dupla de defesa quando um dos tacos não estiver tocando a área do círculo, trocam-se as posições. Ganha quem fizer mais pontos. Essas são as principais regras do Bete, pelo que lembro. O campo do jogo era a rua. E nós nos sentíamos os donos dela.
Quem nos tirou da rua foi o vídeo game. Numa mesma semana eu ganhei um Odissey e o Riva ganhou um Atari. A turma passava o sábado na minha casa e o domingo na casa de Riva. É certo que eu e ele passávamos as noites aprimorando os conhecimentos em horas de River Raid, Come Come, Senhor das Trevas e Asteroids. Por um tempo, a rua ficou vazia de gente. Sem bola batendo nos muros, sem o som dos tacos, sem infância. A turma se escondeu em frente à TV. Depois, cada um seguiu seu rumo. Hoje, estamos em latitudes diferentes. Há dois anos visitei a rua da minha meninice. Daquela Boa Esperança, restaram só as lembranças. As casas perderam a cor, as árvores e os amigos. Até o asfalto perdeu o viço. Está cheio de buracos. Mesmo assim, ao fechar os olhos, pude ouvir o som dos tacos batendo para desespero da dupla de ataque.
Estas e outras lembranças acordaram com a leitura do livro MÃE DA RUA (Ettori Bottini, Cosac Naify). O autor desfila uma crônica da sua infância na São Paulo dos anos 50 e 60, além de apresentar um manual de instruções para jogos como bola de gude, jan ken po e taco (é como ele chama o Bete), entre outras brincadeiras. É um livro para meninos. Futebol, carrinho de rolimã e revólver de feijão não faziam parte do universo feminino daqueles tempos. O texto emociona desde o início. O capítulo A Turma é de arrepiar os cabelos da unha. O projeto gráfico é um primor. Fotos e ilustrações nos remetem a um tempo distante, medido na frase que abre o livro, em que a mãe grita para o filho: - Vai brincar na rua, moleque!!! Ettori Bottini tem um olhar aguçado que já rendeu belos e premiados trabalhos na área das artes gráficas. Neste primeiro livro, seu olhar não sensibilizou o papel com imagens. Ele foi além: fotografou parte da infância com palavras. As imagens ficam por conta de cada leitor. Para mim, ele fotografou a rua Boa Esperança e uma turma de meninos que, embora distantes, sabem-se amigos. Hatuna Matata.

P.S. Dia desses, cozinhando o corpo e a mente nas águas quentes das piscinas termais do Goiás, ensinamos os meninos a jogar "palitinho" com pedrinhas. Sucesso total! E viva a cultura infantil!

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Férias e Protetor Solar...

Para quem está com saudades de novas postagens... uma foto das FÉRIAS dos Roedores de Livros. No caso, usando o Mãe da Rua como protetor solar... Voltamos dia 22 de janeiro. Abraços de letrinhas a todos. Hatuna Matata!!!

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Mais oficinas para crianças na Fnac

Deu no SUPER - suplemento infantil do Correio Braziliense - no último sábado, 05/01...
Mais uma vez, a Ana Paula vai coordenar oficinas infantis na Fnac Brasília. Tudo de graça, com material incluso e a garotada pode levar o que fizer para casa. No jornal, divulgam as oficinas de fantoches (21/01), cofrinho (22/01) e cinco marias (24/01), mas a programação se estende com mais duas atividades: aviões de papel (23/01) e traca-traca (25/01). Sempre as 16h30. Vagas limitadas mediante inscrição prévia na bilheteria da Fnac Brasília ou pelo telefone 21052000. Confira a programação completa no site da Fnac.

Para uma melhor visualização dos recortes, basta clicar sobre a imagem.


domingo, 6 de janeiro de 2008

Entre livros e filmes... fique com os dois!!!

A rapidez com que o cinema tem adaptado livros infanto-juvenis tem me preocupado. Isso, porque muitas adaptações são de obras recentes que não tiveram tempo de chegar aos leitores com a calma e divulgação necessárias. A força da indústria do cinema leva um público numeroso a suas salas e acaba afastando-os do livro. Stardust, O Senhor dos Ladrões, Ponte para Terabítia e Arthur e os minimoys são ótimos livros quase todos com menos de cinco anos de publicação por aqui e que estão em cartaz no cinema ou já disponíveis em DVD. O maravilhoso Coração de Tinta (trailer) estréia em abril nas salas do mundo inteiro. Dizem que o celebrado A Invenção de Hugo Cabret – lançado em 2007 – já teve os direitos adquiridos e está em fase de roteirização. Coraline (de Neil Gaiman) já está quase pronto para exibição. E por aí vai.

A mídia do áudio-visual tem uma força incrível e não é fácil resistir. Como convencer a um jovem que é melhor encarar as 1.212 páginas da trilogia O Senhor dos Anéis do que suas nove horas de exibição em DVD? Posso dizer que o livro oferece mais detalhes, põe a imaginação para funcionar, dá mais frio na barriga... mas quase sempre perco a briga para o filme. E se não há filme sobre o livro, já ouço alguns afirmarem que vão esperar para ver no cinema, certos de que o texto será adaptado. Não estou negando o cinema como alimento da fantasia. Adoro. E há ótimas adaptações como As crônicas de Nárnia (livro) e Desventuras em Série (livro). Só fico um pouco triste por não ter como divulgar um bom livro para mais pessoas antes que o cinema deixe a todos com preguiça de ler. É fato que eu vim a conhecer alguns livros depois que suas histórias foram parar no cinema. Muitas editoras aproveitam para lançar suas edições na cola da divulgação do filme. Mas gostaria de ter lido antes, de ter criado a minha fantasia, de ter madrugado em suas páginas.
Por falar em cinema, este é um dos programas básicos para se fazer quando a grana não está sobrando no bolso e há duas crianças de férias em casa numa cidade grande. Nas férias, vários filmes entram em cartaz e para a garotada a lista é até razoável: Bee movie, Encantada, Alvin e os esquilos, Os porralokinhas, Xuxa em sonho de menina. Bem... Não vou questionar a qualidade de todos e, sinceramente, alguns desta lista eu prefiro nem chegar perto. Mas na primeira semana do ano reuni a turma para assistir A Bússola de Ouro e, por se tratar de mais uma versão cinematográfica de um livro, acho que merece a minha atenção e a dica para todos.

O filme é a adaptação do livro homônimo (que eu nunca havia ouvido falar – perdoem minha ignorância) originalmente lançado em 1995 mas que só chegou ao Brasil em 1998 com o título A Bússola Dourada (Philip Pullman, Objetiva) e que ao lado dos livros A Faca Sutil e A Luneta Âmbar compõe a trilogia Fronteiras do Universo. Aproveitando o embalo do filme, os três livros foram relançados pela editora com novas capas. A história é fabulosa, se passa num universo paralelo e tem uma menina, Lyra, como personagem principal (pelo menos neste primeiro momento). Uma das sacadas criativas do autor é que naquele universo, as “almas” de cada pessoa se transfiguram em animais – os dimons – que vivem ao lado de cada um adquirindo a forma da personalidade do seu “dono”. Ursos guerreiros, feiticeiras, uma guerra política entre diferentes etnias, armadilhas, ambições e muita aventura. Tem também uma bússola de ouro (hehehe) que serve como um oráculo para quem sabe manuseá-la. Para trazer à tona a fantasia de Philip Pullman, só com muitos efeitos especiais. E são de altíssima qualidade.

Andei lendo por aí que muita gente não gostou do filme, achou chato e até falam sobre uma possível intenção do autor em promover o ateísmo... olha, eu não vi nada disso. Meu olhar infantil gostou do que viu. Saí do cinema com a vontade de conhecer toda a história. O certo é que é impossível não comparar à produção do Senhor dos Anéis que ganha disparado em todos os quesitos – o que não desmerece o filme a Bússola de Ouro. Vale o ingresso. Mas, se o bolso agüentar e a curiosidade for tamanha, leve os livros para casa. O primeiro da trilogia ganhou vários prêmios literários e a série é cultuada por todo o mundo. O cinema segue adaptando livros de sucesso e levando um público gigante para suas salas de exibição. Isso não vai mudar. Tomara que estas iniciativas consigam despertar em outros o desejo de descobrir os originais impressos ou, quiçá, novas aventuras. Hatuna Matata.

P.S. No site oficial do filme dá para você criar seu próprio dimon. Muito legal!!!

terça-feira, 1 de janeiro de 2008

Água numa taça de cristal

O ano acordou quente em Brasília. Pelo menos para mim. Quente e preguiçoso. Uma sede danada. Não era ressaca do reveillon. Era calor, mesmo. Nada de interessante na TV. Nenhuma disposição para sair de casa. Resolvi apostar numa boa leitura. Dois livros da Lucia Hiratsuka estavam sobre a pilha de livros ao lado da estante: HISTÓRIAS TECIDAS EM SEDA (Cortez) e HISTÓRIAS DE MUKASHI (Elementar). Eles me dariam as boas vindas ao universo da literatura infantil em 2008. E assim foi.

Eu e Ana Paula conhecemos Lucia em São Paulo no primeiro dia do Seminário Prazer em Ler em agosto de 2007. Ela estava ao lado de Peter O’Sage e Renata Nakano. Coincidentemente, sentamo-nos juntos. Dela eu só conhecia a versão para Urashima Taro e havíamos visto o Histórias de Muiashi numa livraria e namoramos sua belíssima capa e ilustrações. Ela é um doce. Olhar atencioso ao fã insistente e sorriso desarmado na roda de amigos. Guarda o talento sob o corpo pequeno, esguio, tradicionalmente oriental. Mas, por suas ilustrações, imaginamos que se agiganta no estúdio como se um dragão marinho (um ryu) se apoderasse dos pincéis e das palavras.

Em Histórias Tecidas em Seda, Lúcia selecionou três contos que têm o fino tecido como elemento. Hachikazuki conta sobre uma menina princesa que recebe um estranho presente no leito de morte de sua mãe. Tanabata é a lenda oriental sobre uma história de amor entre um homem e um ser encantado que é imortalizada numa festa tradicional que acontece até hoje, no mês de julho, chamada Festival das Estrelas. O Pássaro Poente revela que uma boa ação oferece suas recompensas. Tema que se repete em A Raposa e o Camponês, primeiro conto do livro Histórias de Mukashi, que é a palavra japonesa para antigamente. Outros cinco contos dão corpo à obra revelando personagens, ritos e crendices que habitam o imaginário do povo japonês. Coincidentemente, dois destes contos abordam a chegada do ano novo. Eu, que já havia me encantado com as ilustrações de Lucia Hiratsuka, me surpreendi com seu texto. Enxuto, simples, direto e bonito. Chega fácil no coração da criança e maravilha a todos. Em cada livro, um pequeno glossário introduz o leitor no universo fantástico do oriente. Foi uma bela surpresa para começar o ano.

Em 2008, teremos várias atividades culturais em homenagem ao centenário da imigração japonesa no Brasil. A cultura nipônica estará em alta. Aparecerá em exposições de arte, enredo de escola de samba carioca, festivais gastronômicos, etc. Por sua vez, Lucia, que desde pequena ouvia sua avó contar histórias do Japão e do Oriente, não espera por data alguma para falar de suas origens. Há muito reconta e ilustra com delicadeza e simplicidade a bela e tradicional cultura japonesa. Sua delicadeza e simplicidade são como água servida numa taça de cristal. Mata a sede de todos, com um toque de beleza. Neste primeiro dia do ano, quente e preguiçoso, bebi das palavras e imagens de Lúcia Hiratsuka. Matei a sede do primeiro dia. Sinto que beberei mais da sua arte. Hatuna matata.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

A criança encontra o universo e seus segredos

Começo a resenha com um trecho do Juramento do Cientista: “Juro usar meu conhecimento para o bem da Humanidade. Prometo Jamais causar dano à pessoa alguma na minha busca de sabedoria”. E aí, deixo o alerta a você, caro leitor(a): Siga as palavras à risca para não sofrer a Maldição da Vida Alienígena.

No início dos anos 80 o Sistema Solar contava com 9 planetas. Eu tinha 8 anos e não sei se aprendi isso nas aulas de ciências ou nas madrugadas assistindo a série COSMOS de Carl Sagan. O fato é que ficava acordado até tarde para ver aquelas imagens maravilhosas do universo e do planeta Terra. Muito antes do telescópio Hubble e dos efeitos da computação gráfica. Temas fascinantes para olhares curiosos e o meu sempre o foi. Mas falar sobre o Universo é trabalhar lado a lado com a Física, uma matéria nada dócil quando não se tem o dom para a coisa. Nunca fui fã da matéria. Tinha facilidade para decorar as fórmulas, mas não entendia bem o porquê daquilo tudo. Acabei me entregando às explicações que lia nas revistas em quadrinhos. Os segredos científicos desvendados por Reed Richards do Quarteto Fantástico, por exemplo, constituíam a minha Ciência particular. Havia uma lógica ali que cabia na minha cabeça fértil por descobertas. É claro que guardava para mim toda aquela gama de conhecimento sobre raios cósmicos, universos paralelos e buracos negros. Afinal, ninguém mais me explicava como o mundo estava ali, cheio de hidrogênio, oxigênio, moléculas de carbono...

Talvez não passe pela cabeça dos adultos que este assunto seja de interesse infantil. Pois bem, acabei de ler o livro GEORGE E O SEGREDO DO UNIVERSO (Lucy e Stephen Hawking, Ediouro) e o menino que habita em mim adorou. Acredito que uma criança por volta dos 10 anos poderá se divertir com esta ótima aventura e aproveitar para conhecer o motivo que levou a comunidade científica a considerar apenas 8 os planetas do nosso Sistema Solar. Há mais descobertas: é possível escapar de um buraco negro; dá para imaginar como seria viajar num cometa; visualizar o nascimento e a morte de uma estrela, além de outras informações acerca dos mistérios do universo. Os autores (Stephen Hawking – um dos maiores gênios da Física e sua filha Lucy) escrevem numa linguagem fácil demonstrando uma paixão pelo assunto que contagia o leitor com o vírus do conhecimento. Enfim, ciência e a fantasia juntas, num livro recheado de delícias.
Uma delas é o trabalho do ilustrador Garry Parsons que dá ainda mais agilidade à história que fala do encontro de George, um menino cuja família vive às margens da tecnologia, com sua nova vizinha, Annie, uma menina muito esperta que guarda em casa o computador mais poderoso do mundo: Cosmos. Daí, a ponte para viagens ao espaço, intrigas na escola, um professor misterioso e descobertas científicas. Outra delícia são as fotos coloridas de estrelas, cometas, planetas, luas, nebulosas e outros elementos do universo. Há ainda – paralelo ao enredo – quadros explicativos com curiosidades sobre o Sistema Solar. A história, embora recheada de verdades absolutas, é uma grande ficção. Um delicioso petisco para iniciar a garotada no fantástico mundo da ciência. Neste livro, o leitor verá que um pouco de ciência pode entreter e ao mesmo tempo abrir seus olhos para o que acontece “lá fora”.

Agora, nunca esqueça do Juramento do Cientista. Use o conhecimento para o bem, senão poderá ser vítima da Maldição da Vida Alienígena que vocifera: “Você ficará verde, o seu cérebro borbulhará e vazará pelas orelhas e pelo nariz. Seus ossos virarão borracha e nascerão centenas de verrugas pelo seu corpo. Só poderá comer espinafre e brócolis e jamais tornará a assistir televisão, pois ela fará seus olhos caírem da cabeça”. Putz, nem na série V – A Batalha Final tinha uma maldição desta qualidade!!! That´s all, folks.

P.S. 1. Os trechos em laranja foram copiados do livro.

P.S. 2. Para os adultos que resistem a um livro com “caráter infantil” mas estão em busca de alguma ficção com noções sobre o universo, recomendo a leitura de Contato, de Carl Sagan. Se a preguiça atacar, vá à locadora e peça a versão cinematográfica, com Jodie Foster. Os dois são imperdíveis!!!

P.S. 3. A primeira foto é a do maior Buraco Negro já descoberto, com 22 a 34 vezes a massa do Sol.

P.S. 4. Para os amantes da Ficção Científica e loucos por um humor refinado recomendo O GUIA DO MOCHILEIRO DAS GALÁXIAS, de Douglas Adams. É ÓTIMO!!!

segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

A mais incrível história de todos os tempos!!!

Em 1849 o Papai Noel vestia uma roupa marrom. Mas o Natal daquela época já mantinha tradições que sobrevivem até hoje como a árvore de natal, o presépio e as canções (Noite Feliz, por exemplo, já fazia parte do repertório). Era também tempo de presentear.

No natal daquele ano, numa casa inglesa, um pai desembrulha o presente para seus oito filhos (*) e esposa. Um manuscrito escrito por ele mesmo acerca da vida de Jesus Cristo. Baseado no Evangelho segundo São Lucas, seu conteúdo sugere algo como um Novo Testamento para crianças. O escritor em questão foi o genial Charles Dickens, autor de clássicos da literatura universal como Canção de Natal e Oliver Twist. Mas o autor do presente não vestia a beca de renomado escritor e sim a de um pai de família, preocupado com a formação dos filhos. Em vida, Dickens não autorizou a publicação da obra, exigindo que ela fosse um segredo cultivado por sua família. Publicado pela primeira vez em 1934, mais de seis décadas após sua morte, o livro A VIDA DE NOSSO SENHOR (Charles Dicken, Martins Fontes) permanece fora da lista das obras do autor. Pode não ser uma obra prima para os estudiosos. E, como Dickens expressou sua vontade de que o texto não fosse publicado, talvez ele mesmo não visse nada de literário nele.

Porém, querido leitor, quando descobri este livro no final de 2006 não desgrudei de suas páginas até o final. Por isso, esqueça o papo acima sobre lista oficial, obras literárias e afins. A história que este livro conta você já conhece, mas seu filho pode não conhecê-la por inteiro. A forma como Charles Dickens a desenvolve é por demais carinhosa e conquista o leitor independente da idade. Embora possa ser lida por qualquer criança, acho que fica mais gostoso se um adulto puder compartilhar desta leitura, pois é fácil encontrar a figura do pai na voz do narrador. Apesar da força católica que a personagem Jesus carrega em si, a leitura deste livro ultrapassa as amarras das crenças religiosas. Em suma, apresenta a fantástica história de um homem pleno de virtudes e seu final trágico para que a humanidade pudesse garantir seu lugar no Paraíso.

Talvez seja difícil pensar que comportados, venturosos, caridosos e piedosos, nossos filhos estejam a salvo numa possível vida após a morte. O mundo de hoje exige virtudes tanto quanto cuidado. E existe um apego ao real que transforma o Paraíso numa TV de 50 polegadas ou num Vídeo Game de última geração. A felicidade é urgente e fugaz. Mas a leitura deste livro retoma valores quase esquecidos neste mundo tão virtual.

Em 1849 pensar no nascimento de Cristo e em suas ações fraternas ainda eram os principais motivos para celebrar o Natal. Na abertura do livro, Charles Dickens escreveu: “Meus queridos filhos. Estou muito ansioso para que vocês conheçam algo sobre a história de Jesus Cristo, pois todo o mundo deveria conhecê-Lo. Jamais viveu alguém tão bom, tão afável, tão gentil e tão cheio de perdão para com todas as pessoas que erraram, ou que eram de alguma forma doentes, ou miseráveis, como Jesus. E como ele está agora no Paraíso, para onde esperamos ir e nos reunir depois de morrermos, e lá sermos sempre felizes, juntos, vocês jamais poderão imaginar que lugar bom é o Paraíso sem saber quem Ele era e o que fez”. Que nosso Natal seja pleno de paz e que as famílias possam se reunir em fraternidade para – assim como fez a família de Dickens - recontar a fantástica vida de Jesus Cristo e aprender com ela. Hatuna Matata.

(*) Depois de 1849 Charles Dickens teria ainda mais dois filhos.

P.S. A primeira imagem deste post reproduz um Natal em família na Inglaterra Vitoriana do tempo em que Dickens escrevia seus livros.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Presentes de Natal

Queridos amigos, neste final de ano, com a proximidade do Natal, Papai Noel já trouxe boas notícias. Algumas, ainda não posso revelar. Outras, divido com vocês. Ontem, estrearam dois blogs que os Roedores de Livros esperam que sobrevivam na blogosfera. O primeiro, é escrito pela Cláudia Orthof e Mariana Rosa. A primeira postagem apresenta o presépio acima, montado pela própria Sylvia Orthof. A dupla promete compartilhar o acervo de Sylvia com todos nós, internautas. Já está nos meus favoritos. O endereço é http://sylviaorthof.blogspot.com. Passem lá.

Outra surpresa foi descobrir que Elma, querida ilustradora, mãe e avó coruja, também defila seu talento no universo virtual. Seu Blog Tempo de Ternuras apresenta seus livros e belas ilustrações. Ela abre com um cartão de natal muito lindo... passem lá para conferir. Abaixo, uma lembrancinha da felicidade do nosso primeiro encontro. Elma, eu e Rosinha Campos desfilamos sorrisos no Salão do Livro da FNLIJ. Êêêêita saudade!!!

terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Valentina quer dar os parabéns!!!

Aqui em casa não faltam caixas. São muitas. De vários tamanhos. Eu mesma as faço. Adoro imaginar o que cada uma vai guardar. Escolher o tecido ou o papel que vai envolver o marrom do papelão. Algumas ficam fechadas por muito tempo. Outras, quase não descansam a tampa. É o caso da caixa que guarda (?!?!) os livros que esperam a vez de nos encantar com suas histórias. Em seu interior, acumulam-se os volumes que ficam numa fila desorganizada. Uns pulam na frente, outros se escondem no fundo... vez em quando eles aprontam uma surpresa. Foi o que aconteceu hoje.

Eu estava procurando o Pequeno Nicolau quando dei de cara com VALENTINA (Márcio Vassallo, ilustração de Suppa, Global). Posso jurar que ouvi a menina me convidar para uma voltinha em suas páginas. Talvez porque, assim como ela, eu tenha ouvidos que escutam cochicho de nuvem. De qualquer forma, aceitei o convite e tirei Valentina da caixa. Comecei pela última página e aí, descobri que hoje, 18 de dezembro, é o aniversário do Márcio Vassallo, autor do livro. Coincidências do mundo da fantasia. Ri um riso que esparramou pelo rosto feito gato espreguiçado.

Trouxe Valentina para a cama e ela reconheceu o cheiro de abraço amarrotado. Deitei o olhar em suas páginas. Conheci e me encantei com a menina-princesa, moradora de um castelo localizado na beira do longe, lá depois do bem alto. O rei e a rainha, pais de Valentina, faziam algo que a intrigava: desciam do castelo todo dia para trabalhar. Ela não entendia bem o porquê. Assim como estranhava ter que esconder sua beleza que não cabia em página de livro. A menina morava longe de Tudo. Até que um dia foi com os olhos e os pés conhecer Tudo de perto. Lá, descobriu que todas as meninas daquele lugar sonhavam em ser princesa. Mas a menina Valentina já era princesa e morava num castelo logo depois do mais longe de Tudo.

As metáforas embelezam o enredo de Márcio Vassalo. E o que escrevi acima sobre a história não revela tudo o que o livro apresenta de melhor. Há muito mais. Há muita beleza nas ilustrações inspiradíssimas de Suppa que abusa do papel reciclado, pinturas e colagens com tecidos, plásticos e papéis. Formas geniais de vestir a menina-princesa e seu universo. Há muito mais.

O livro Valentina, além de contar uma bela história, reverencia uma infância repleta de reis, rainhas, príncipes e princesas que todos somos ou fomos um dia. Brincando no quarto, nos braços da mãe, no mundo dos sonhos. Não há fronteiras para o sonho. Em Qualquer Lugar habita a realeza. Longe de Tudo ou no meio de Tudo somos assim: repletos de fantasia. Pelo menos, deveríamos ser. Nas entrelinhas, o livro transborda realidade. Parabéns Márcio Vassalo. Sua personagem pulou da minha caixa para te desejar um Feliz Aniversário. Eu também lhe felicito. Pelo natalício e pela bela história que descobri nesta noite. Agora é hora de deixar Valentina dormir na estante e procurar O Pequeno Nicolau na minha adorável caixa de livros.

P.S. As frases em destaque são copiadas do livro Valentina.